Xango Ayrà

Xango Ayrà
Kaô Kabiecilê!

segunda-feira, 11 de abril de 2011

A RELIGIÃO: CANDOMBLÉ

Os povos africanos trazidos para o Brasil como escravos entre os séculos XVI e XIX, os mais importantes para a formação da cultura nacional afro-brasileira foram os Yorubás e os Bantus, oriundos, respectivamente, das bacias dos Rios Níger (atual Nigéria) e Congo (atual Congo e Angola). Esses povos possuíam uma estrutura social e econômica muito complexa e avançada. Organizados em Reinos que ocupavam vastas áreas divididas em províncias, distritos e aldeias, tinham uma estrutura sofisticada de comunicações, manufatura (inclusive metalurgia), comércio (inclusive com povos de regiões distantes), finanças, governo e força militar. Um traço característico desses povos era a organização de tendência matriarcal das aldeias, que se refletia em sua religião. Muito organizada rica e complexa, a religião desses povos contava com dois tipos de hierarquia sacerdotal: as mulheres eram responsáveis pelo contato direto com os deuses, através do êxtase ritual e dos cuidados do templo; os homens cuidavam da adivinhação e da cura. Os ritos fúnebres do culto dos ancestrais eram separados do culto dos deuses, que são forças da natureza ou heróis divinizados. Entre os Yorubás, era dada grande importância ao culto dos Orixás; uma característica dessa religião é a jovialidade dos deuses, que geralmente se mantinham bem distantes dos mortos. Já os Vodus do Dahomé, alguns dos quais chegaram ao Brasil trazidos diretamente pelos Jejes ou através da religião Yorubá, eram deuses austeros e temíveis, muito ligados a terra e à morte. Os Inkices, deuses dos Bantus, foram assimilados pelos Orixás Yorubás, que a eles pareciam. Como os Bantus foram trazidos para o Brasil desde o início da colonização e se espalharam por um vasto território, tendo grande contato com portugueses e índios, sua religião foi pouco a pouco se misturando ao xamanismo indígena e às crenças religiosas e mágicas européias. Por isso, enquanto a religião Yorubá foi renascendo e se reorganizando na Bahia, onde esse povo ficou mais concentrado, a religião Bantu foi amalgamada com inúmeros outros elementos, desde os rituais caboclos até o espiritismo abraçado pelas classes médias urbanas no final do século XIX, resultando numa religião totalmente nova e essencialmente brasileira. Portanto teve bastante influência ritualística e de pronuncias na nova religião chamada Umbanda. Nas Regiões Norte e Nordeste, as crenças africanas foram fortemente influenciadas pelas tradições ameríndias e européias, originando várias tradições religiosas e mágicas típicas dessas regiões do país.
Em suma, desenvolveu-se basicamente na Bahia, onde é mais forte, embora tenha representantes nas outras regiões do país. Sua estrutura foi determinada principalmente pela religião do povo Yorubá, mas também recebeu influências de povos do Dahomé e Congo, embora estas tenham sido incorporadas à base da religião Yorubá, cuja organização e culto foram reconstituídos quase sem a interferência de elementos cristãos e indígenas. Das centenas de divindades locais e regionais africanas, restou um pequeno grupo que resume os elementos essenciais da natureza e da vida humana.
Segundo os mitos mais divulgados, Olorum criou Ifá (o destino), Obatalá (o céu) e Odudua (a terra). Obatalá e Odudua tiveram dois filhos: Iemanjá (o mar) e Oxalá (a luz do céu). Estes dois a Grande Mãe e o Grande Pai geraram quase todos os Orixás que governam o mundo: Exu, Ogum, Xangô, Oxossi, Ossaim, Oxum, Iansã e Obá. Da união de Xangô com Iansã nasceu Ibeji e de Oxum e Oxossi nasceu Logunedé. Oxalá também se casou com Nanã, que gerou Omolu, Ewá, Iroko e Oxumaré; este é um grupo de Vodus (deuses do Dahomé) incorporados à religião Yorubá ainda na África.
Uma pessoa descobre quem é seu Orixá por vários motivos: quando algum desequilíbrio em sua vida a faz procurar auxílio religioso, quando o Orixá se manifesta espontaneamente se apossando de seu corpo, ou quando a criança ou o jovem é levado pela família para o interior do culto. Embora as características do Orixá possam aparecer em traços físicos e psicológicos, somente o Pai – de – santo pode identificá-lo com segurança. Na África, o Orixá era o ancestral mítico protetor de uma aldeia, de todas as suas famílias e, portanto, de todas as pessoas que aí nascessem. No Brasil, como os escravos tiveram seus grupos familiares despedaçados, precisaram reconstituir seus laços com os deuses. A solução encontrada foi o uso da intuição do Sacerdote, que através do jogo de búzios pôde identificar a filiação espiritual de cada um.
O objetivo do Candomblé é promover a harmonia total, física e psíquica, interior e exterior, dos fiéis. Para isso, conta com dois tipos de práticas. No culto público, a família espiritual formada pelos filhos – de – santo da casa ou terreiro se reúne periodicamente para, através do êxtase provocado por cantos e danças rituais, entrar em contato com os Orixás que governam suas cabeças, ligando-se ao arquétipo que alimenta sua vida psíquica. Para participar do culto público, os filhos – de – santo, após identificar seus Orixás, passam por um período de iniciação em que “morrem” para a vida comum, renascendo para a vida em contato com o Orixá, e passam por todo um processo de reeducação que simboliza a infância de sua nova vida. Depois dessa fase, o filho – de – santo assume o compromisso de realizar uma série de atividades destinadas a cuidar de seus deuses pessoais.
No culto privado, o fiel realiza uma série de práticas periódicas destinadas a cuidar de seu Orixá, incorporando ao seu quotidiano o elo de ligação com essa figura arquetípica. Estas práticas incluem o uso das cores e adereços característicos de seu Orixá, a oferta de alimentos e presentes em altar doméstico ou em locais externos adequados, o uso de banhos, perfumes e defumadores feitos das ervas que sintonizam com o Orixá. Os rituais de iniciação ao culto do Candomblé de Keto no Brasil se desenvolvem através das seguintes fases:
Bori
Da fusão da palavra bó, que em yorubá significa oferenda, com ori, que quer dizer cabeça surge o termo bori, que literalmente traduzido significa “oferenda à cabeça”. Do ponto de vista da interpretação do ritual, pode-se afirmar que o bori é uma iniciação à religião, na realidade, a grande iniciação, sem a qual nenhum noviço pode passar pelos rituais de raspagem, ou seja, pela iniciação ao sacerdócio. Sendo assim, quem deu bori é lésè òrisà.
Feitura
O ritual de feitura de iniciação ao sacerdócio no Candomblé recebe vários nomes; fazer o santo, fazer a cabeça, deitar para o santo, aba baxé ori ou simplesmente oro, que é sinônimo de sacrifício e consagração. A pessoa que se inicia no Candomblé torna-se adoxu, ou seja, passa a possuir um oxu, que é o canal de comunicação entre o iniciado e seu orixá. Todo iniciado no Candomblé, toda pessoa “feita no santo” – do neófito ao sacerdote – é adoxu.
Feitura representa um renascimento; é o reconhecimento e a admissão do ori escolhido no orum. É o mesmo que entregar a cabeça (principio da individualidade) ao orixá (o deus maior de cada ser), permitindo que os deuses conduzam sua vida e seu destino. A feitura é um divisor de águas na vida e tudo será novo, inclusive o seu nome, pois todo o iniciado recebe um Orukó, ou seja, um nome dado por seu orixá.
Obrigações de um, três e cinco anos.
Nestas fases são ofertadas comidas aos Orixás, tendo seus sacrifícios e preceitos, é também o tempo ao qual o Iyawo utiliza para adquirir conhecimentos prévios (aprender a fazer comidas para os Orixás, aprender as rezas, aprender a tirar um ebó, aprender a montar uma mesa de bori, aprender a tratar o Orixá como um todo, participar os osés e orôs), para sua futura nomeação de Ebomy.
Obrigação de sete anos
A maioridade no Candomblé é atingida quando o Iyawo atinge os sete anos de iniciação. O ritual de passagem que se processa é chamado de Obrigação de sete anos (oyé ou deká). Nesse ritual o filho-de-santo deixa de ser yawô e passa a ser um ebomy, que quer dizer irmão mais velho, e recebe o cargo (oyé): seja de sacerdote, seja de autoridade na comunidade. Um filho-de-santo quando reconhecido pela comunidade como um membro importante pode ser emancipado e assumir essas funções antes de completar sete anos, mas a obrigação não pode ser adiantada. Lembrando sempre que ninguém pode dar o que não têm.

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